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Uma Mentira Perfeita, de Lisa Scottoline | Resenha

‘Uma Mentira Perfeita’: aquela leitura viciante

O quanto você conhece o seu vizinho? Os seus colegas de trabalho? Seus amigos de escola? O mundo de aparências e segredos sombrios costuma ser o combustível principal e mais inflamável para o desenvolvimento de um thriller. Entretanto, essa base não é uma garantia. Aquela sensação de ‘preciso terminar esse livro, para o mundo que eu quero ler’ não vem à toa, nem de graça. Um bom thriller precisa de alguns tópicos que prendam o leitor a cada página, a cada linha. Felizmente, Uma Mentira Perfeita, publicado pela HarperCollins Brasil, tem todos eles.

A história do livro de Lisa Scottoline começa com Chris Brennan se adaptando à nova e pacata cidade de Central Valley, na Pensilvânia. Brennan assume o posto de professor substituto no ensino médio local e treinador de beisebol da escola. Tudo isso soa tranquilo, mas nada é tão preto no branco assim. O recém-chegado tem outro nome, um currículo falso e um plano secreto. Suas intenções em Central Valley são, pouco a pouco, reveladas à medida que o tempo passa e as relações dele com seus habitantes se intensificam. Mas o que sabemos desde o início é que Chris precisa de um “involuntário”, um aluno que sirva de fonte para obtenção de informações para que seu projeto seja um sucesso.

Ao ler os primeiros capítulos, você pensa que Chris é algo entre um psicopata terrorista e um traumatizado desesperado, e isso foi muito estranho para mim. A autora pareceu entregar o personagem e o enredo por completo em menos de cinquenta páginas! Mas calma, calma, não priemos cânico. Lisa Scottoline sabia bem o que estava fazendo e, assim, você pode desligar os alarmes de ‘esse livro é ruim’ e continuar a leitura com confiança porque, no momento em que você chega ao Segundo Passo, você ganha um plot twist de qualidade, no melhor estilo Gillian Flynn. Não desista no Primeiro Passo, você não vai precisar acompanhar o protagonista e somente ele por todas as páginas. Os alunos das escolas, em especial os alvos de Chris, são desenvolvidos através de capítulos dedicados às suas mães – tacada de mestre da autora -, nos mostrando quem são e quais são as suas dores e ambições.

A partir do momento em que chegamos nessa virada, Uma Mentira Perfeita ganha velocidade e surpresas, além de mais sentido nas intenções do protagonista. Nossas suspeitas ganham um novo mistério e saímos de uma fase confusa, na qual o passado de Chris era o mais interessante para uma nova etapa, para outra em que o presente e o futuro são focos bem mais interessantes.

O grande tema trabalhado no livro é bem delicado, em especial para os Estados Unidos: o terrorismo doméstico. Motivados por traumas, ideologias políticas ou religiosas, desequilíbrios psicológicos, entre outros, ataques violentos com explosões de bombas ou tiroteios infelizmente habitam os noticiários com mais frequência do que desejamos. E, com mais assiduidade ainda, os filmes, séries e livros exploram tal temática. Uma Mentira Perfeita abriga e constrói um enredo viciante e de adrenalina crescente, trabalhando muito bem as reações que esse tipo de terrorismo, suas motivações e background dos envolvidos podem causar no julgamento e na moral do leitor. Ele levanta, inclusive, questionamentos sobre vandalismo e manifestação, a diferença entre justiça e vingança e aquele clássico: o que é certo e o que é errado.

A voz que nos guia pelos planos de Chris é bem fluída e direta, sem deixar a narrativa estancar ou tornar-se chata. Os capítulos relativamente curtos colaboram com esse padrão de velocidade. Assim, as quatrocentas páginas ficam menos assustadoras e mais acolhedoras. A única parte dessa voz que me incomodou foi quando, em algumas horas, a autora mostrou-se um pouco repetitiva. Nada, no entanto, que estrague a experiência de leitura.

A edição publicada pela HarperCollins Brasil veio com qualidade e com uma capa bem bonita e super adequada à história. A tradução, contudo, foi outro ponto que também me incomodou, pois tive a sensação de que algo foi perdido do estilo da autora, ganhando um tom mecânico. Mas deixo claro que é uma sensação abstrata, uma vez que não li a história na língua original e isso pode ser totalmente sem sentido para você, o outro leitor.

Cheguei no final desse texto e senti falta de falar mais sobre as personalidades dos personagens. Mas isso entregaria tantos spoilers que quase daria a história de mão beijada neste post. Deixo a simples afirmação: os personagens são uma forte fonte de todo o appeal de Uma Mentira Perfeita. Quer saber? O livro todo é bom. Fica difícil de falar qual é a melhor parte. Pega para ler e me diz?

Apaixonada por música, cinema, séries e literatura, história mundial e andar de bicicleta. Sonha em ter muitos carimbos em seu passaporte, mas por enquanto escreve sobre o que leu, viu e gostou no Anatomia Pop.

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