Entrevistas

Entrevista: Maja Lunde

Em entrevista exclusiva ao Vai Lendo, a escritora norueguesa fala sobre o seu primeiro livro adulto, a relação entre a natureza e as relações humanas e a importância da literatura para as crianças

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Maja Lunde / Foto: Oda Berby

O elo entre a natureza e as relações familiares. A descendência, o futuro das gerações interligados a pequenos seres que geralmente costumam passar despercebidos no nosso dia a dia, mas que desempenham um papel importante para a humanidade. Em Tudo o Que Deixamos Para Trás, publicado pela editora Morro Branco, a escritora norueguesa Maja Lunde aponta como o desaparecimento das abelhas pode afetar tudo, principalmente os humanos.

“A ideia (do livro) começou com as abelhas, depois de eu assistir a um documentário sobre o Distúrbio do Colapso das Colônias”, explicou Maja em entrevista exclusiva ao Vai Lendo.”Quando eu comecei esse trabalho, eu tinha três perguntas: ‘por que as abelhas morrem’, ‘como é a sensação de perdê-las?’ e ‘como seria o mundo sem insetos polinizadores?’. Para eu responder a essas perguntas, pesquisei muito e, ao longo dessa pesquisa, encontrei os três personagens principais do livro – no passado, no presente e no futuro. Nós precisamos de todos os constituintes da natureza, tanto os menores quanto os maiores. Abelhas, insetos, são praticamente como um termômetro para a saúde do planeta. Quando eles estão com problemas, nós estamos com problemas. Muitos leitores me dizem que o livro abriu seus olhos para esse aspecto do mundo, que os ajudou a entender que as mudanças climáticas não são algo tão abstrato quanto o aquecimento global, mas também acontece no nosso próprio quintal. Tudo está conectado”.

Embora a obra – sua primeira publicada aqui no Brasil – traga esse apelo ambiental, Maja ressaltou o caráter pessoal do livro, que aborda, cima de tudo, as relações entre pais e filhos. Para ela, esse é um tema intrínseco ao ser humano e acima de qualquer cultura e diferenças sociais. Por isso mesmo, os leitores conseguem se identificar com o assunto e com os personagens e se engajarem.

“As três histórias falam sobre pais e filhos, o que eu, como mãe de três, consigo me relacionar”, declarou. “Essa relação traz um amor imenso, mas também uma grande ambivalência. E principalmente evolução. Eu vejo isso na minha relação com os meus três filhos. À medida em que eles evoluem, meu papel como mãe também muda. Há sempre algo novo para aprender, novos desafios, mas também novas coisas para nos sentirmos agradecidos. Como pais, queremos sempre o que for melhor para os nossos filhos, mas nem sempre sabemos o que é e nos esquecemos que nossos filhos são diferentes de nós, que o que é certo para nós nem sempre o é para eles. Com isso, eu imagino, os pais do mundo inteiro conseguem se identificar e, sim, talvez seja por isso que leitores de vários países estejam gostando tanto do livro. Queremos dar tudo a eles, mas, às vezes, tudo é demais. É preciso pensar um pouco menos em nós mesmos e mais na comunidade. Eu acredito que quando um livro aborda algo humano, verdadeiro, não importa da onde ele veio. A literatura é sempre um espelho do mundo real e na leitura eu creio que sempre queremos nos identificar com a história. Sentir, de alguma forma, o que os personagens estão sentindo e nos reconhecer neles. Quando eu escrevi Tudo o Que Deixamos para Trás, pensei muito na minha própria família. Especialmente quando escrevi sobre Tao, que teve o seu filho de três anos tomado dela. Quando eu escrevi essa história, meu filho caçula tinha três anos e eu realmente consegui sentir a sua dor. Eu não quero dizer para os leitores o que sentir. Há sempre três histórias num livro: a que está na cabeça do escritor quando ele escreve, o texto puro no papel e aquele que o leitor imagina quando lê a obra. Essa é a mágica da ficção”.

Tudo o Que Deixamos Para Trás – que recebeu o prêmio de melhor livro de 2015 pela Associação de Livreiros da Noruega – é o primeiro livro adulto da escritora, conhecida por suas obras voltadas para o público infanto-juvenil, bem como por seus roteiros para programas de TV. Maja, por sua vez, destacou as principais diferenças entre as narrativas e os desafios de se escrever para as crianças, uma vez que há toda uma preocupação com o conteúdo, bem como a consciência de apresentar a literatura para os pequenos leitores. Ela, que visitou o Brasil pela primeira vez para o lançamento do livro, exaltou o carinho do público brasileiro – e a comida! – e disse que não vê a hora de escrever o seu próximo romance para nos visitar novamente.

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‘Tudo o Que Deixamos Para Trás’, de Maja Lunde / Divulgação

“Às vezes, é mais difícil escrever para as crianças do que para os adultos”, concluiu ela. “Quando eu escrevo para adultos, eu basicamente escrevo aquilo que eu gostaria de ler. Mas, quando eu escrevo para crianças, eu preciso encontrar a menina de 10 anos dentro de mim e escrever para ela. Contudo, também tento tornar o meu livro infantil divertido para os adultos. Eu gosto de trabalhar em diferentes níveis. As crianças norueguesas poderiam ler mais. Os livros vivem numa competição acirrada com todas as coisas que surgem em todos os tipos de telas. Eu vou continuar escrevendo para as crianças, porque acredito que é muito importante dar a elas bons livros, boas histórias, e não há nada que me faça mais feliz do que um pai me dizer que meus livros abriram as portas para esse fantástico mundo literário para o seu filho”.

Jornalista de coração. Leitora por vocação. Completamente apaixonada pelo universo dos livros, adoraria ser amiga da Jane Austen, desvendar símbolos com Robert Langdon, estudar em Hogwarts (e ser da Grifinória, é claro), ouvir histórias contadas pelo próprio Sidney Sheldon, conhecer Avalon e Camelot e experimentar a magia ao lado de Marion Zimmer Bradley, mas conheceu Mauricio de Sousa e Pedro Bandeira e não poderia ser mais realizada "literariamente". Ainda terá uma biblioteca em casa, tipo aquela de "A Bela e a Fera".

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